“Se nossas crianças não se reconhecem enquanto seres da terra, seres da natureza, antes de seres humanos, nós não vamos nos reconhecer enquanto parte do problema climático e não vamos conseguir superá-lo”, discursou Thiago Karai Djekupe, liderança da Terra Indígena Jaraguá Pyguae e ativista das questões climáticas.
Thiago fez essa provocação a uma plateia de cerca de 50 lideranças de organizações que contribuem com a educação brasileira, na última sexta-feira, dia 19 de abril. O evento não celebrava exatamente o Dia dos Povos Indígenas, mas era como se fosse. A liderança encerraria sua fala de abertura com outra provocação à civilização não-indígena. “Nossa educação sempre busca pela evolução, nunca é voltada para o ser e sentir”.
Tocada pela fala de seu convidado, Anna Penido, diretora-executiva do Centro Lemann, e uma das anfitriãs do evento, aceitou a provocação e perguntou à plateia: “Nós não precisamos, nos currículos, ter esse tipo de sabedoria? Integrar esses conhecimentos sobre clima e território à educação para poder avançar?”.
As perguntas de Anna, mediadora da conversa, aqueceu a plateia e os demais convidados do “Diálogo Clima, Educação e Equidade”, um esforço do Centro Lemann em parceria com o Instituto Itaúsa para que lideranças educacionais do terceiro setor pudessem refletir sobre crise climática, seus efeitos nas desigualdades e como a escola pode e deve interagir e colaborar para enfrentar esse desafio.
Responsável por abrir a conversa, Neca Setubal, conselheira do Instituto Itaúsa, celebrou e justificou aquele diálogo aberto. “Nós estamos neste auditório porque estamos conscientes de que o clima precisa entrar na escola de forma orgânica e aberta para a comunidade”.
O Instituto Itaúsa atua pelo desenvolvimento sustentável do Brasil e, como especialista do tema, coube ao seu head de sustentabilidade, Marcelo Furtado, traçar um panorama das questões climáticas para os especialistas presentes.
Primeiro, o ambientalista falou de três crises simultâneas – clima, natureza e pessoas – para dizer como isso afeta a educação de maneira direta e implacável. “Em um mundo que deverá completar, neste ano, o aquecimento do planeta em 1,5 graus anunciado no Acordo de Paris (2015), esse não é um problema trivial. Com a crise do clima, falta água, falta comida, e as prioridades simplesmente mudam: as pessoas deixam de mandar as crianças à escola”, alertou.
Furtado apontou para soluções possíveis no horizonte. “Nossa oportunidade está em três transições: uso consciente da água, uma agricultura de baixo carbono e, terceiro, uma mudança nos nossos padrões de emissão”.
A interface com a educação
Na última parte do Diálogo, os três convidados foram provocados a apontar caminhos para que a educação integre esse debate e ajude a encontrar soluções. “O que a gente não pode fazer é tratar as questões trazidas aqui como temáticas de meio ambiente. Essa conversa é sobre sociedade, é pauta econômica e educacional. Nós precisamos sair do nicho e tratar o clima e a educação como temas transversais de toda a agenda”, defendeu Furtado.
Em um discurso emocionante, Thiago relembrou seus ancestrais e defendeu a integração da escola aos territórios indígenas como forma de trazer os estudantes para perto dos povos tradicionais brasileiros. “Tem muita gente que não sabe que em São Paulo, aqui perto da gente, tem uma terra indígena. É necessário que as escolas criem uma rotina de visitas a esses territórios, criar um sistema de diálogo que possa quebrar o racismo e o preconceito desde a escola”, finalizou.